NOTAS DE ESCURECIMENTO POR ESCRITO – Série de questões enviadas para pretas escritoras negras e negros escritores pretos que gentilmente responderam
Escritora de hoje: Lu Ain Zaila
Textos para saborear: https://linktr.ee/luainzaila
CONVERSAS
NOTAS DE ESCURECIMENTO: Por gentileza, se apresente:
LU AIN-ZAILA: Meu nome é Luciene, mas no mundo literário sou Lu Ain-Zaila
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Quando se descobriu negra?
LU AIN-ZAILA: Acho que na adolescência isso começa a ficar mais nítido e começam as desavenças do racismo e a percepção do mundo vai tomando forma.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como a sua ancestralidade estão nos seus escritos?
LU AIN-ZAILA: Ela está no processo de produção literária, não só minha, mas de uma população como um todo. Por isso estudo e pesquiso para ter mais entendimento do que trago para a literatura. O conhecimento se transforma, não é algo pautado do tipo aqui vou colocar isso e aquilo. Não funciona assim…
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual é ou foram as suas relações com os seus pais?
LU AIN-ZAILA: Boa, nada que se destaque da normalidade. Minha mãe sempre foi minha principal incentivadora em meio às dificuldades.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual é, na sua opinião, a função social da sua literatura?
LU AIN-ZAILA: Nos tirar do lugar, nos transportar para outras vidas. Faz com que possamos nos divertir, aprender, concordar, questionar, nos coloca em posições inusitadas e lidamos com sentimentos conflitantes que saem do lugar simples. E a literatura afrofuturista tem um adendo de reivindicar um modo de narrativa próprio das pessoas negras com base em seus valores, conhecimento, legado, cultura. É um conjunto civilizatório servindo de base para meios próprios de contarmos histórias.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como é você leitora?
LU AIN-ZAILA: Eu gosto muito de ler de ficção à não ficção. Ambas me ensinam sobre universos, me dão pitadas de imaginários ficcionais. Eu gosto do que me detém e faz viajar para um mundo extra da história, o famoso quero mais…
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Quais suas negras influencias?
LU AIN-ZAILA: É difícil pautar, minha leitura é abrangente e tem meu envolvimento com movimentações negras também. Então não é uma coisa só, uma lista. Eu faço muitas conexões entre ficção e não ficção, então eu sempre indico um tempo dedicado a se informar antes de cogitar escrever senão você não muda seu centro de apoio cognitivo e faz mais do mesmo.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual foi o seu primeiro e decisivo ato literário?
LU AIN-ZAILA: O ato decisivo não foi a primeira escrita, o conto de 2007, mas o movimento de 2015 que me fez colocar de pé a Duologia Brasil 2408 de forma independente, iniciando a jornada que me trouxe até aqui, tanto ficcional quanto não ficcional, pois uma coisa pode ajudar a outra se soubermos minimamente o que precisamos aprender sobre nós mesmos. Então sempre indico a filosofia Africana como um início que nos orienta nos valores e sentidos.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como é, para você ser uma escritora negra no Brasil?
LU AIN-ZAILA: Um desafio porque estamos num país gigante de maioria não leitora, não porque não quer, mas porque ou não se vê na narrativa ou foi ensinada a ver cultura como menos e literatura menos ainda. E isto também é resultado de um recorte racial e racista, de um hiato democrático e até tecnicista que moldou para o trabalho e demonizou a Arte, matando a originalidade em muitos campos, inclusive do trabalho, tecnologia e outros. Nos torna limitados e copiadores por um hiato de conhecimento que a literatura por si só não dará conta, mas que pode ajudar no meio educativo ao deixar fios para serem puxados.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Para que e quem você escreve?
LU AIN-ZAILA: Escrevo para mim e para um público que precisa perceber que a literatura é um meio de expressão de muitos povos e a nossa população negra precisa contar e ler ainda muitas histórias. É um longo caminho para a naturalização da literatura de ficção como meio de entretenimento. Acredito que ajuda e muito no combate de ideias racistas transmitidas por outras literaturas e conteúdos.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Inspiração ou transpiração?
LU AIN-ZAILA: Uau, as duas coisas andam juntas, Num momento você tem aquela sacada de escrita, mas não desenvolve e no outro dia você precisa de informação, argumento, detalhes técnicos que vão te ajudar na inspiração, em saber que rumo o personagem vai tomar, como vai se sentir, como aquela sociedade vai mudar. São as duas coisas em constante troca.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual é o seu processo de escrita?
LU AIN-ZAILA: Faço notas de coisas que em algum momento vão fazer sentido, coisas para me aprofundar, frases, tópicos para ler, mais notas e então algo ali vai virar uma história, parágrafos, carta de personagens como se falassem de si, a coisa vai se montando. É um processo cíclico de persistência.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Tem um narrador ou eu lírico que sempre utiliza em seus escritos?
LU AIN-ZAILA: Não, eu gosto da primeira pessoa para personagens, mas já misturei com uma voz narradora, já usei o “você” numa troca com o leitor. O melhor caminho é aquele que deixa a sua história se escrever…
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Quais são os seus principais temas?
LU AIN-ZAILA: Não tenho um principal, a não ser escrever histórias afrofuturistas com o tudo o que tenho, de Lélia ao estudo/leitura dos mitos, de Fanon à fluidez das cidades de Santos. Da mistura do fantástico com o sacolão perto de casa, as pessoas. Escrever é abrir uma caixa de liberdade para transformar tudo em vai saber o que.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como foi e é para você a publicação de um livro?
LU AIN-ZAILA: Difícil ainda em termos econômicos, mas deu uma melhorada e entendo esta jornada como um abre caminho que tem que ir lá, trocar, apresentar, contar histórias e gosto desta troca, me dá chance de perceber que ainda temos um imenso público a conquistar. Não temos um público negro, temos pessoas negras descobrindo a leitura de um viés que nunca viram ou leram ou vão achar. E sendo um universo especulativo negro, menos ainda.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: O que também se faz palavras em seus escritos?
LU AIN-ZAILA: Eu gosto de sons, respiros, tenho uma intenção de contador de histórias que gosta das pausas e pouco dos travessões, o disse. Eu uso falou, sentiu, eu preciso de uma dimensão fluida de escrita e tomo a liberdade que precisar para que possa escrever.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Poderá nos oferecer cinco livros, de autores negros brasileiros, que na sua opinião, são fundamentais.
LU AIN-ZAILA: Acho complicado a ideia de fundamental quando a nossa realidade é de um corpo negro cheio de ocidentalidades que não nos pertencem apreendidas desde o berço e ainda nos ferem porque não entendemos que ainda estão sob nossos ombros. Então eu prefiro recomendar leituras, de minhas ficções e não ficções que sempre tenho a oferecer gratuitamente, há nomes, períodos, referências, citações. Será muito mais proveitoso que uma lista. É lendo amplamente e se dedicando que a gente pode perceber a questão maior sobre a importância da leitura negra.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Justo… o que nos sugere?
LU AIN-ZAILA: Filosofia, História, Cultura, Mitologia, Literatura. É pesquisar pessoas negras nestes campos que vai ter um aparato sem igual de conteúdo.
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