NOTAS DE ESCURECIMENTO POR ESCRITO – Série de questões enviadas para pretas escritoras negras e negros escritores pretos que gentilmente responderam
Escritora de hoje: Sol de Paula
CONVERSAS
NOTAS DE ESCURECIMENTO: Por gentileza, se apresente:
SOL DE PAULA: Sol de Paula, psicóloga por formação, poeta, escritora, zeladora das palavras por inspiração. Produtora cultural. Mãe. Natural de Niterói / RJ, cria do bairro Fonseca (zona norte da cidade). Autora do livro de poemas: “Sol em Pequenas Doses”, onde apresenta o cotidiano, as mazelas sociais, o recorte étnico-racial presente no fluxo da vida. Coautora de diversas Antologias em vários gêneros literários.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Quando se descobriu negra?
SOL DE PAULA: Sempre soube que não era branca, pois estudei numa escola católica e muito elitista. Ali era confrontada pela questão racial, sem saber qualificar as situações de racismo que passava. Era muito jovem. Não tenho a pele retinta e isso também camuflava a minha consciência. Na faculdade passo a me enxergar enquanto mulher negra. Fui convidada para conhecer o Centro de Estudos Brasil-África (CEBA). Ali encontrei os meus pares. Passei a entender e confrontar o pacto perverso da branquitude.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como a sua ancestralidade estão nos seus escritos?
SOL DE PAULA: A minha ancestralidade é o cenário, o enredo, os personagens, a base, o recurso, o refúgio, a prospecção que permeia a minha escrita, a minha trajetória literária e de vida.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual é ou foram as suas relações com os seus pais?
SOL DE PAULA: Considero que os perdi muito cedo, mas tudo que me ofereceram, serviram de estrutura para que não me perdesse de mim. Perdi minha mãe aos 19 anos e meu pai aos 26. Tenho muito mais lembranças do que vivências. Nossa relação era de admiração, questionamentos, rebeldia, amor. Família.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual é, na sua opinião, a função social da sua literatura?
SOL DE PAULA: A literatura tem uma função social que é fundamental. Ela precisa causar uma dose de desconforto, provocar uma reflexão, uma mudança de comportamento, ou seja, precisa afetar o outro. Despertar afetos. Não se limitar. Expandir. Ser libertadora sem ser panfletária.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como é você leitora?
SOL DE PAULA: Sou uma leitora que lê os cânones, mas aprecia a literatura feita por autores iguais a mim. Autores que transbordam, no papel, sentimentos onde também me reconheço.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Quais suas negras influências?
SOL DE PAULA: Não sou especialista na obra da Dra. Carolina Maria de Jesus, mas sou amante do seu projeto literário. Incluo também: Conceição Evaristo, Cuti, Cidinha da Silva, Solano Trindade, Jairo Pinto…
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual foi o seu primeiro e decisivo ato literário?
SOL DE PAULA: Escrever manifestos enquanto fui vice-presidenta no movimento negro (CEBA) e posteriormente ao lançar o meu livro solo.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como é, para você ser uma escritora negra no Brasil?
SOL DE PAULA: É levar insistentemente a literatura feminina negra em todos os lugares, que tenham pessoas interessadas em ressignificar seus lugares de fala e escuta. É escrever uma literatura antirracista que expressa a minha ação. É sair do campo das ideias e agir abrindo caminhos.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Para que e quem você escreve?
SOL DE PAULA: Escrevo para transbordar o que já não cabe dentro de mim. É cura. Desafio. Escrevo para todes. A arte tem que ser libertadora, inclusiva com uma dose subversiva de alegria.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Inspiração ou transpiração?
SOL DE PAULA: Uma combinação de sentidos e significados. Gosto das imagens que me levam à poesia e gosto do lirismo que encontro nas imagens.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Qual é o seu processo de escrita?
SOL DE PAULA: Não tenho muita regra, não gosto de prazos ou temas específicos. Prefiro a fluidez e escrevo durante a madrugada. Gosto de ouvir o silêncio.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Tem um narrador ou eu lírico que sempre utiliza em seus escritos?
SOL DE PAULA: Tento manter esse olhar curioso diante dos fatos e uma inquietude que me leva a criar os textos, apesar de certas indignações.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Quais são os seus principais temas?
SOL DE PAULA: Ancestralidade. O cotidiano me atrai. Injustiças sociais. Uma pitada de erotismo, enfim a vida é o meu tema principal.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Como foi e é para você a publicação de um livro?
SOL DE PAULA: Em 2020 no auge da pandemia publiquei o “Sol em Pequenas Doses”. Muitos sonhos, desafios, inexperiência em relação ao mercado editorial, mas tenho amigos leitores que compraram o livro e alimentaram o meu sonho de publicar o segundo, ainda este ano.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: O que também se faz palavras em seus escritos?
SOL DE PAULA: A luta pela equidade. O respeito. A diversidade. A inclusão. O silêncio. O toque. O futuro ancestral.
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Poderá nos oferecer cinco livros, de autores negros brasileiros, que na sua opinião, são fundamentais?
SOL DE PAULA: Cadernos Negros (faço parte dos volumes 43 ao 45); Quarto de Despejo: Diário de uma favelada (Carolina Maria de Jesus); Exuzilhar: Melhores Crônicas de Cidinha da Sila; Tornar-se Negro (Neuza Santos Souza); Poemas da Recordação e outros movimentos (Conceição Evaristo)
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NOTAS DE ESCURECIMENTO: Aponte, por gentileza, cinco figuras negras brasileiras importantes?
SOL DE PAULA: Carolina Maria de Jesus; Conceição Evaristo; Cuti; Luiz Gama; Maria Firmina dos Reis, André Rebouças.
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