ESPETÁCULO INFANTIL :
“MARROM – NEM PRETO, NEM BRANCO?”
Muitos traumas da população negra já na fase adulta vêm da vida infantil quando o preconceito já se expõe de forma fria, agressiva e corrosiva sem a menor misericórdia. O racismo em forma de bullying nas escolas, nos bairros, nas brincadeiras entre amigos. As crianças são as primeiras a receberem essa carga pesada que terão que carregar e saber enfrentar durante toda a vida.
Talvez, devesse existir um “modus operandi”, como uma cartilha que entregaríamos para a população infantil negra, para que ela se preparasse para a tempestade, enquanto existir o preconceito racial.
O espetáculo “Marrom, nem preto, nem branco?” tem o papel de ser a materialização teatralizada dessa cartilha, com humor e ludicidade. E tem muito sucesso na empreitada.
Durante seu tempo de duração, o espetáculo , enquanto discorre a história, enumera uma série de pequenas ações de racismo que acontece no dia-a-dia da população negra, “sem filtro” nem amenização. Casos esses que muitos pais que estão presentes na plateia não conseguiriam citar para seus filhos, para educá-lo sobre o assunto, pelo constrangimento que naturalmente causaria, porém o espetáculo aborda na medida certa, sendo um ponto super positivo dessa dramaturgia e montagem.
O recurso de abordar o tema tão dolorido do preconceito através da comédia é um acerto, apesar de, em muitos momentos, necessitar de uma equalização do tom cômico, evitando que fique tão acima, beirando o desnecessário tom de besteirol.
O talento do elenco chama a atenção. Elenco que pula de um personagem para outro demonstrando toda sua versatilidade e domínio na composição física, nos leques individuais de caracterização. A atriz protagonista Vilma Melo interpreta visceralmente a personagem que carrega o conflito central da trama, em alguns momentos, claramente, dominado as rédeas que determinam para onde vão as emoções do público.
A dramaturgia de Renata Mizrahi poderia cometer erros diante do desafio de tratar um assunto tão abordado e polêmico, flertando com a obviedade e discursos chavão, porém o caminho escolhido, plantado na simplicidade e objetividade, leva à uma estrada de qualidades poéticas que existem no subtexto.
O vazio, existente no fundo de cena sem cenário, composto somente pelo negro da cortina teatral, incomoda, dando a impressão que o espetáculo foi concebido para espaços alternativos, com plateia dos dois lados e não para um palco convencional / italiano.
A bela palheta de cores diversas e unidas, dos objetos cenográficos e figurinos, leva-nos metaforicamente a pensar na segregação racial espalhada pelo planeta.
Bons recursos para mudanças e construção de ambientes, são as marcações precisas de cena, empunhadas pela batuta do diretor Marcelo Alonso Neves e também pela linda iluminação de Binho Schaefer, construída com primor. Sem a iluminação podemos afirmar que veríamos um espetáculo menor, se é que ele ainda existiria nesse formato.
Podemos chamar de descartáveis os momentos cantados; deslocados e sem utilidade dentro da concepção e narrativa, tentando apresentar os personagens num momento musical, quando os mesmos já se apresentaram muito bem à plateia.
No equilíbrio, “Marrom” é um ótimo momento reflexivo, onde a família unida, pode compartilhar a análise sobre as agruras sofridas pelos cidadãos negros, iniciadas na fase infantil , que percorrem até a maturidade, e como se encontrar um caminho para superá-las. Tudo envolto em uma indiscutível qualidade técnica teatral.
cotação: ótimo
FICHA TÉCNICA Texto: Renata Mizrahi
Direção: Marcelo Alonso Neves
Direção de Movimento e Assistente de direção: Ana Paula Bouzas
Elenco: Vilma Melo, Maycon Marcondes, Ana Paula Black, Leandro Castilhos e Maíra Kestenberg
Consultoria de Conteúdo: Cristina Lopes
Direção Musical: Marcelo Alonso Neves
Cenógrafo e Figurinista: Carlos Alberto Nunes
Cenógrafa e Figurinista Assistente: Arlete Rua
Confecção de Cenário:Marco Souza e Patricia Rodrigues
Pintura de Arte: Derô Martin
Confecção de Figurinos: Kátia Salles, Suely Gherard e Nilssy Maldonado
Programação Visual: Alexandre Muner
Fotografia: Arthur Vianna
Assessoria de Imprensa: Duetto Comunicação
Direção de Produção: Piéterson Duderstadt
Elaboração de Projeto: Janaína Santos, Piéterson Duderstadt e Vilma Melo
Gestão Administrativa e Financeira: Pedro Almeida e Naiara Cavalheiro
Equipe de Produção: Piéterson Duderstadt, Naiara Cavalheiro, Maycon Marcondes e Vilma Melo
Idealização: Piéterson Duderstadt e Vilma Melo
Realização: Cia da Cidade
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