Conversa com a artista Lia de Castro intermediada por Bárbara Iara e Hugo e Mariana Leme
“Lia D Castro: a cumplicidade refletida
por Mariana Leme
Há um homem deitado no sofá, de costas para o espectador. Há outro homem deitado no sofá — ou seria o mesmo?
— sobre o colo de uma mulher, cujas roupas são feitas de pintura e esparadrapos. A mesma cena íntima se repete algumas vezes, num interior geométrico feito de azuis e verdes. Ela lê um livro. Às vezes ele também lê. Há um abajur. Dentro de algumas pinturas, outras pinturas, como um caleidoscópio.
Por meio da repetição — de gestos, cenas, personagens
e cores —, a artista Lia D Castro deixa evidente a
dimensão reflexiva das pinturas e dos encontros que elas representam, tanto no sentido de espelhamento quanto no de contemplação e pensamento. Em uma delas, há a citação de bell hooks: “O amor é uma combinação de cuidado, compromisso, conhecimento, responsabilidade, respeito
e confiança”, que acompanha as bordas da parede. Talvez todos os trabalhos de Castro estejam ancorados no amor. Não o amor burguês que muitas vezes se confunde com exploração de gênero, mas aquele definido por hooks, que é também “um espaço de despertar crítico e de dor”. Que é ativo, colaborativo e cúmplice: no processo da pintura ou da fotografia, nos encontros e nas trocas sociais, afetivas, financeiras, criativas e criadoras.
Além de artista, Castro é também intelectual, educadora e trabalhadora sexual, entre muitas outras coisas. Os retratos são de seus amantes e clientes, com os quais estabelece uma relação de intimidade e compromisso. Leem juntos. E ela nos convida a adentrar as cenas, como se fôssemos cúmplices daquele momento tranquilo, que em nada lembra o estigma social que recai sobre corpos e corpas dissidentes, e sobre trabalhadores/as sexuais.
Talvez as obras sejam o inverso de uma sociedade estruturada por hierarquias sociais, raciais, territoriais e
de gênero, ou representem o desejo de desmantelar este “contrato” profundamente violento. É como se restituíssem a humanidade de sujeitos socialmente indesejáveis, repelidos, invisibilizados e mortos. Nas obras de Castro, vemos pessoas atravessadas por histórias e afetos, gente que gosta de descansar, de perder-se em pensamentos e devaneios, de estar perto de objetos bonitos, amigos, amores.”
Serviço –
Conversa com a artista Lia de Castro intermediada por Bárbara Iara e Hugo e Mariana Leme
Sábado – 18/03/2023
15h30
Rua Dr. Cesário Mota Jr, 443
São Paulo
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