A relação dos povos quilombolas e indígenas com o novo governo.
Tenho pensado que todo sentimento é construído a partir de uma realidade concreta. Ando triste por estar com minha mãe doente. Estou infeliz, ansiosa e com medo do futuro em razão do novo governo que se instaura. Isto é, a dor é inerente aos seres humanos, já o sofrimento é a dor transversalizada pela injustiça: a realidade do racismo contra a população negra e indígena é um sofrimento, que leva a humilhação.
Com certeza, nos anos 2002/2003, quando a atriz Regina Duarte manifestou seus medos em relação ao candidato Lula da Silva, também, havia de minha parte questões particulares que me preocupavam, entretanto, encontrava-me mesmo na incerteza, cheia de esperanças em relação a um novo projeto social. Questionava-me: o presidente Fernando Henrique, em que pese, todas as críticas pela sua adesão às determinações do Consenso de Washington, foi o pioneiro em reconhecer o racismo no Brasil, dando start as políticas de ações afirmativas, implementou o I Programa Nacional de Direitos Humanos da América Latina.
Cheguei a pensar: será que o PT vai continuar com as políticas de ações afirmativas? Mas não tive medo, pois tinha certeza que teríamos um projeto societário de inclusão de classe e das diversidades, o qual minimamente poderia reduzir as desigualdades.
Assim, os governos petistas deram continuidade de forma espetacular às reivindicações da população negra e às políticas voltadas para a consecução da igualdade implementadas no Governo FHC.
“Nossos passos vêm de longe”. Os governos podem ser mais ou menos refratários às questões étnico-raciais, mas nenhum governo nos deu nada de graça.
Desta forma, o discurso do atual Governo pregando que Lula dividiu o Brasil entre os negros e brancos é falacioso. Não se divide o que já está dividido pelo passado histórico, pelo racismo, pelo classismo, sobretudo, pela ignorância e falta de vontade política.
Então por que a Regina Duarte estava com medo?
Acredito, que Regina Duarte como branca, originariamente de classe média, tornando-se famosa e rica como latifundiária agropecuarista estava desde sempre defendendo o projeto societário de sua classe social, especificamente, os interesses dos agropecuaristas, conforme se observa na reportagem A ATRIZ REGINA DUARTE É A VOZ ATIVA DE PECUARISTAS CONTRA DIREITOS INDIGENAS https://www.pragmatismopolitico.com.br/2012/08/regina-duarte-famosos-contra-indios.html.
Bem o Bolsonaro não mentiu. Durante a campanha disse tudo o que pretendia fazer. Declarou explicitamente que a minoria tinha que se submeter à maioria. Nós negros, indígenas, pobres somos minorias políticas e econômicas, mas unidos teremos força política para pressionarmos esse governo no atendimento as nossas reivindicações.
Estou com medo porque em toda a minha vida nunca vi nenhum governo expressar tão diretamente de forma tão absurda e desrespeitosa seu desprezo por pessoas e culturas. Ele não pode dizer que no Brasil não existe racismo. “Que temos a cor do Brasil”. Juro não saber se é ignorância ou má fé. Se a cor do Brasil fosse respeitada as desigualdades raciais não seriam tão gritantes neste país.
A pessoa mais apta a dizer se uma linguagem é racista ou não é quem passa por ele. Segundo o documento CIEDH – INTERNATIONAL COUNCIL ON HUMAN RIGHTS. La perestencia y mutación del racismo. CIEDH, 2001.
A pessoa que é objeto de racismo experimenta os sentimentos mais profundos de ofensa, humilhação, vergonha e dor. O racismo é a negação de seu direito a ser considera totalmente humana. Neste sentido, as pessoas que sofrem o racismo são as mais aptas para dizer se um comportamento ou linguagem é racista ou não é (CIEDH, 2000, p. 3).
Ele (Bolsonaro) acredita piamente saber do que os índios precisam
Para Bolsonaro, o índio precisa das mesmas necessidades básicas de qualquer ser humano. Por isso, promete integrá-lo à sociedade, caso seja eleito. “A grande parte dos índios são brasileiros como nós. Ele quer ter energia elétrica, televisão, namorar loirinha, ter internet…”, sustenta. https://www.rdnews.com.br/executivo/para-bolsonaro-demarcacao-sufoca-economia-e-indio-quer-luz-e-internet/82989
Como Lucien Goldmann diz não existe discurso sem incongruências, portanto essa preocupação esconde um enorme envolvimento com o agronegócio. Claramente ele diz “prejuízo para o agronegócio”
Para Bolsonaro, as reservas indígenas e quilombolas atrapalham a economia. “Onde tem uma terra indígena, tem uma riqueza embaixo dela. Temos que mudar isso daí”, afirmou. “Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem pra procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gastado com eles.”
Somos todos iguais no Brasil, contanto que seja um Brasil que exista Casa Grande e Senzala, com muitas mulheres negras trabalhando de sol a sol sem carteira assinada. Carteira assinada para as empregadas domésticas é risco para a estabilidade das patroas ricas, conforme sugere Bolsonaro. https://www.youtube.com/watch?v=24mY2urwvc8
Nos negros e indígenas estaremos à própria sorte porque o racismo é transversal. Fez parte da socialização primaria da atriz Regina Duarte. O pai dela acreditava que lugar de negro era na cozinha, todavia, ela não vê nenhuma maldade nisso. Hitler com certeza era um bom pai.
Mas estou com medo do governo e do Brasil. Estou com medo pelos jovens negros e indígenas, pelas mulheres negras e indígenas, pelos (as) pobres e por aqueles que têm outras orientações sexuais.
Eu tenho medo porque esse governo governará para o Capital, e, não vai nos ouvir. Já a atriz Regina Duarte não está com medo. Está se sentido segura, pois os interesses e necessidades dela e de sua classe social estão garantidos.
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