Diáspora Afro-Brasileira: Expectativas no Governo do Presidente Lula.
Antes de iniciar qualquer avaliação sobre as expectativas do próximo governo do presidente Lula para os Afro descendentes brasileiros devo primeiramente passar alguns dados que farei em tópicos.
- POPULAÇÃO AFRODESCENDENTE NO BRASIL.
Bem esta questão varia muito de acordo com a auto-declaração enquanto afro descendente. No início dos anos 80 , somente 42% dos brasileiros em uma população de 120 milhões de pessoas se declaravam negras. Atualmente depois da última sondagem 56% entre 215 milhões de pessoas declaram-se negras ( o que já é a maioria da população) e de fato segundo pesquisas de geneticistas, entre 75% e 80% dos brasileiros são afro descendentes segundo a Classificação da Conferência de Durban.
Os afro descendentes espalham-se por todas 5 regiões do Brasil , sobretudo no Nordeste, Norte, Centro Oeste e Sudeste ( onde são maioria da população) e são minoria de menos de 20 % da população da Região Sul que tem forte influência da imigração européia.
- Status Social da população afro descendente no país.
As pesquisas de Institutos Nacionais no Brasil mostram que de fato a população negra se encontra à margem do crescimento econômico do país com os piores indicadores. Como por exemplo, as mais baixas taxas de escolaridade, os mais altos níveis de pobreza ( dos 10% mais pobres , mais de 75% são afro descendentes e entre os 10% mais ricos apenas 8% são negros , ainda que pela auto-declaração representem 56% da população atualmente), o maior número de pessoas assassinadas ( 75% dos assassinatos são de pessoas negras, principalmente homens entre 16 e 28 anos, pois a cada 23 minutos um jovem negro é morto principalmente pela polícia). Inclusive no mercado de trabalho onde as taxas de pessoas negras em cargos de Direção e chefia é ínfimo não chegando nem a 10%, sobretudo no setor privado como também a média salarial da população negra é praticamente metade da população branca. Um outro dado importante é que ainda que o país tenha adotado o sistema de ações afirmativas em cargos públicos na maioria dos Estados, muitos municípios e em nível Federal, assim como em Universidades Publicas, o país ainda concede mais vistos de trabalho para estrangeiros em cargos técnicos e de Direção e Administração (europeus e pessoas da América do Norte sobretudo) do que jovens negros mortos por ano, com a justificativa de falta de pessoas suficientemente capacitadas no país. Portanto é clara a questão da marginalização da população negra no país ainda que seja maioria, ainda que ações afirmativas tenham sido adotadas no país em favor desta população. O que já começou historicamente desde o período da Escravidão Negra e mesmo após a abolição que por muito tempo proibiu que afro descendentes fossem proprietários de terras ou mesmo estudassem, isso fora o fato das políticas eugenistas do país no sentido do embranquecimento da população nacional que em 1923 chegaram a proibir a entrada de imigrantes negros no país, com o intuito de não reforçar ainda mais o percentual de afro descendentes na população do país. ( o que não aconteceu com os imigrantes europeus e orientais que tiveram inclusive ações afirmativas no final do século XIX e início do século XX para que se estabelecessem no país, ao contrário da população negra que se viu em maioria relegada às favelas e periferias do país).
3 – Qual é a Esperança e quais são as expectativas para os Afrodescendentes durante o próximo governo Lula.
Para iniciar devo dar um panorama do que ocorreu nos outros governos do Presidente Lula e da Presidente Dilma ( do mesmo partido) entre 2003 e 2016.
Neste período a primeira lei a ser aprovada foi a 10639/03 em 2003 que obrigava o Estudo de Cultura Africana e Afro-Brasileira na Educação do país nos ensinos fundamental e médio nas disciplinas de Língua Portuguesa, História, Geografia e Educação Artística sobretudo, o que era uma reivindicação de mais de 60 anos ( desde os anos 1930/1940) do Movimento Negro. Contudo a lei não veio acompanhada de dotação orçamentária nem de fiscalização, o que faz com que mesmo hoje quase 20 anos depois de sua promulgação ela não seja cumprida de fato, dependendo dos humores e posições religiosas ( muitas vezes ) dos professores da rede pública sobretudo que muitas vezes devido às mesmas evitam de tocar no assunto em sala de aula com seus alunos por muitas vezes, no caso sobretudo dos neo-pentecostais classificar tudo o que refira-se à África ou à cultura Afro Brasileira como algo demoníaco (ainda que estejamos em um país supostamente laico no Brasil) , não sendo punidos por causa disso, além do fato da falta de obrigação da previsão de dotação orçamentária na administração pública para a aplicação desta lei. O que de certa forma serve mais para calar o Movimento Negro do que ajudar a mudar as relações de hegemonia cultural para que as conquistas sociais, assim como a transformação de relações sociais em favor da população afro descendente mais oprimida se consolidem.
Além disso no Governo Lula foi Criada a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial vinculada à Presidência da República, assim como o Estatuto da Igualdade Racial que orientou as políticas públicas em favor da população afro descendente após sua criação no primeiro governo Lula entre 2003 e 2006.
Durante o Governo Lula e Dilma também foram criadas uma série de ações afirmativas no serviço público e nas Universidades Estaduais e Federais o que possibilitou o aumento do número de profissionais negros na administração pública, assim como de estudantes afro descendentes nas Universidades sobretudo Públicas, o que possibilitou que número de Afro Descendentes com nível universitário passasse dos menos de 2% no final dos anos 90 para mais de 51% no último ano do seu governo no passado, o que foi um grande progresso, sem dúvida, ainda que o setor privado ( que é o que mais emprega no Brasil) não seja por lei obrigado a adotar políticas de diversidade, nem racial, nem de gênero o que ainda continua gerando várias disparidades em relação à presença da população negra nas empresas, sobretudo em cargos de direção e alto nível técnico ( o que faz com que muitos negros do país ainda que tenham a formação para assumir tais cargos, sejam sub aproveitados e mesmo sub-empregados.).
Quanto à questão da Esperança da População Afro-descendente no próximo governo Lula , temos a clara possibilidade da recuperação dos retrocessos vividos nos Governos Temer ( 2016-2018 ) e Bolsonaro ( 2019-2022) que sabotaram e agiram contra toda e qualquer política em favor da população negra no país em seus governos, sobretudo no atual governo Bolsonaro (apoiado por supremacistas brancos de todo Mundo, inclusive o Líder da Ku Klux Klan) que no seu desmonte das políticas mesmo que insuficientes dos 13 anos de administração do governo do Partido dos Trabalhadores dos Presidentes Lula e Dilma Rousseff, chegou a colocar um responsável pela Cultura Negra no país que dizia que o Negro deveria voltar a ser escravo e quem não estivesse contente com o Brasil que voltasse a África e fosse viver no Congo, o país mais pobre do Mundo ( segundo dizia), dizia que o Negro no país deveria tornar-se Cristão e que os mitos africanos eram coisa do demônio, assim como a Responsável pelo o que seria a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial ( uma mulher branca e cristã ) afirmava
. Ele mesmo o próprio Presidente Bolsonaro chegou a afirmar que negros não serviam nem para procriar, comparou-nos a animais e dizia que seus filhos não casariam-se com negras por serem “ bem educados” (Não se pode esperar nada além de destruição de toda política pública em favor dos afro-descendentes de um governo de tal mandatário como Bolsonaro que nos tornou párias da diplomacia internacional), portanto qualquer governo, ainda que não fosse do Presidente Lula tenderia a ser melhor do que o de Bolsonaro para a população negra do país.
Sem dúvida há grandes esperanças e expectativas quanto ao governo Lula a partir de 1 de janeiro de 2023, que em discurso afirmou retomar políticas antirracistas e em favor dos afro-descendentes, assim como a volta ao combate à fome a à pobreza que seus últimos governos, assim como os da Presidenta Dilma de seu partido, erradicaram no país em 2014 e que agora sob o governo Bolsonaro retorna ( com mais de 33 milhões de pessoas passando o descalabro da fome e metade da população do país – mais de 105 milhões de pessoas- em situação de insegurança alimentar). Inclusive a antiga Secretaria de Promoção da Igualdade Racial deverá passar ao status de Ministério da Igualdade Racial ( e não mais Secretaria).
De qualquer forma não há clareza quanto o aumento substancial a dotação orçamentária para tal ministério ou políticas públicas em favor da população afro-descendente.
Um exemplo claro deste descaso institucionalizado quanto às políticas em favor das tradições negras foi quando no Governo Dilma destinava-se alguns milhares de dólares para a proteção de casas de tradições de matrizes africanas atacadas sobretudo por cristãos neo-pentecostais, enquanto, ao mesmo tempo perdoava por pressão da bancada evangélica no Congresso, uma dívida de bilhões de dólares destas igrejas que incitam os ataques às casas de matrizes africanas, a nossos mitos africanos e valores civilizatórios patrimônios culturais nacionais, assim como quando veio ao Brasil o Alaafin de Oyo ( uma das maiores autoridades da Realeza Yorubá, com quem o país tem uma dívida histórica devido sobretudo ao tráfico negreiro quando mesmo após a sua interdição no Atlântico, traficantes brasileiros de escravos em nome do governo brasileiro no final do século XIX durante o Império , seqüestraram toda corte de Oyo e enviaram ao país na qualidade de escravizados ) a Presidenta Dilma envia o quinto escalão do goveno para receber tal autoridade e vai à Inauguração do Tempo Cristão Neo-Pentecostal de Salomão ( de um dos maiores líderes religiosos neo-pentecostais do país ), onde os pastores costumavam pedir que os fiéis deixassem seus carros e doassem tudo o que tinham para a igreja, como incitavam que doentes crônicos até mesmo de AIDS deixassem de tomar seus medicamentos e mesmo usassem preservativo ( no caso dos doentes de AIDS) , havendo por isso casos de infecções criminosas entre seus parceiros e pessoas chegassem até mesmo a morrer por causa de tais ações ( e de alguma forma ir na inauguração de tal local mostra descaso a tais atittudes), desta forma ignorando uma autoridade africana com a qual o país tem uma dívida histórica e prestigiando outra que chega até a incitar atos criminosos através da exploração da fé humana e com a qual o país não tem nenhuma dívida ou obrigação histórica, somente por conivência política.
Neste mesmo sentido particularmente me preocupo com a posição de compromisso através de Carta Aberta que o Presidente Lula tomou para si junto aos Cristãos Evangélicos Conservadores, o que não ocorreu da mesma forma com as autoridades do Movimento Negro, ainda que em discurso tenha afirmado a retomada de políticas públicas antirracistas e em favor dos afro-descendentes em geral.
Dessa forma não há expectativa de avanços substanciais em políticas públicas em favor dos afro-descendentes, além do que já fora feito nos seus governos anteriores, se não houver aumento igualmente substancial na dotação orçamentária para tais políticas, o que vem se mostrando improvável, ainda que de Secretaria a Igualdade Racial passe a status de Ministério. Contudo o combate à miséria, à fome e ao desemprego ( que atingem de forma mais efetiva à População Afro-descendente no país) que os Governos anteriores dos partidos dos Trabalhadores do Presidente Lula mostraram-se eficazes tenderão certamente a repetir-se neste governo, o que afetará diretamente a população negra do país de forma extremamente positiva.
Além disso, a tendência será uma retomada das relações diplomáticas e investimentos deste novo Governo Lula junto a praticamente todos países africanos, o que é benéfico para as relações da África com a Diáspora Africana no Brasil.
Em suma, haverá melhoras substanciais e importantes em relação ao atual governo Bolsonaro para nós afro-descendentes no país, contudo talvez ainda não sejam o suficiente para erradicar as disparidades sociais que nos desfavorecem, que as estatísticas mostram, e sobretudo por pressão de bancadas conservadoras no Senado e Congresso.
De qualquer forma nos resta a esperança certa de melhoras importantes em nosso cenário atual para uma transformação efetiva no futuro e o fim dos retrocessos dos últimos 6 anos de governos dos presidentes Temer e Bolsonaro.
Axé ( Assim seja)
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