Claudete Alves
Mulher Guerreira


Essa talvez seja a melhor denominação que poderia ser dada a Claudete Alves, presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de São Paulo, o Sindsep, maior sindicato de servidores municipais da América Latina.

Claudete também faz parte da diretoria executiva da Federação dos Trabalhadores do Estado de São Paulo e é vice-presidente da ULATMUN, União Latino Americana dos Trabalhadores Municipais.

Por sua ligação a essas entidades, ela já esteve participando de congressos em vários países, como o realizado pelo STAL (Sindicato dos Trabalhadores na Administração Local, de Portugal), em abril deste ano, na cidade portuguesa de Portimão. Na ocasião, Claudete foi aplaudida de pé e teve aprovada uma Moção de Repúdio contra a má administração do município de São Paulo, que foi assinada pelos representantes dos 23 países presentes.

Militante de movimentos populares (moradia, contra o racismo e outros) e do Partido dos Trabalhadores, desde os 15 anos de idade, Claudete conquistou respeito entre os companheiros de luta, e ficou famosa (inclusive na imprensa) pela ousadia e arrogância com que empenha a batalha pelos direitos de sua categoria e de todos os trabalhadores. Em dada ocasião uma foto notória, de um desses momentos, foi estampada na capa do jornal Folha de São Paulo: Claudete literalmente "peitava" a deputada federal Zulaiê Cobra Ribeiro, numa discussão contrária às reformas do presidente FHC e em defesa da Previdência.

É com a mesma "petulância" que essa mulher de 40 anos de idade, casada e mães de dois adolescentes, lidera um sindicato com 57 diretores e uma base de 147 mil trabalhadores, passando por cima de dificuldades, do machismo, dos inimigos e impondo sua autoridade de "mulher guerreira".

Na entrevista abaixo, Claudete fala de sua entrada no Sindicato, de como o administra, das ameaças de morte que já sofreu, de como combate o machismo e o racismo e outros assuntos.

Portal Afro - De que maneira você chegou a presidência do maior sindicato de servidores públicos municipais da América Latina (que representa cerca de 140 mil trabalhadores) e à coordenação de 57 diretores sendo, parte deles, do time masculino?

Claudete Alves - Foi esforço, dedicação, competência e, acima de tudo, ousadia. Muita ousadia de arriscar, "pagar para ver" e empenhar ações e projetos necessários. Lembro que na solenidade da minha posse como presidente do Sindicato, na minha primeira gestão, Alice Vicente, a ex-presidente que estava passando o cargo para mim, me disse a seguinte frase: 'Estou te entregando um grande abacaxi azedo. Faço votos de que você saiba descascá-lo'.

Portal - Nossa! Imagino que com isso você deve ter ficado assustada e pensando duas vezes antes de assumir o posto...

Claudete - Nada! Aquelas palavras ficaram martelando na minha cabeça...Terminada a solenidade de posse, Alice me entregou a chave da porta da sala que passaria a ser minha: um cubículo, onde só havia uma mesa e uma cadeira quebradas. Essa precariedade não se restringia só a minha sala, mas refletia a situação em que o Sindicato se encontrava. A entidade estava atolada em dívidas, com mais de 70 títulos protestados, ações trabalhistas na Justiça, nenhuma inserção na mídia e sequer era conhecida dentro do próprio meio sindical, na CUT (Central Única dos Trabalhadores), enfim, no cenário ligado às lutas dos trabalhadores. Os problemas não paravam por aí. Nem o livro de registro de funcionários do Sindicato estava em ordem. Milhares de procurações de servidores municipais, se encontravam jogadas no canto de uma sala, esquecidas.

Portal - E como você organizou esse caos?

Claudete - Bem, depois que todos foram embora...

Portal - Ah, você voltou ao relato do dia da sua posse?

Claudete - Isso. Então, quando todos saíram, fiquei sozinha olhando aquela bagunça, aquela falta de estrutura e pensei: vou colocar essa casa em ordem e Deus há de me ajudar. Minha maior preocupação era organizar uma sede que inspirasse credibilidade aos servidores. Isso valorizaria o trabalho do pessoal do Sindicato (diretores e funcionários) e ao mesmo tempo, estimularia os funcionários públicos municipais a ligarem-se ao Sindicato.

Portal - Menina do Céu, a impressão é de que você entrou num beco sem saída...Como resolveu as coisas? Quais foram os primeiros passos?

Claudete - A primeira atitude que tive foi fazer uma reunião com os seis advogados que, na época, cuidavam do setor jurídico do Sindicato. Era preciso dar andamento e encaminhamento às ações dos servidores (aquelas que estavam jogadas num canto), pois esse é um dos serviços mais importantes que o Sindicato presta a categoria. Dei um prazo de 30 dias para que os advogados colocassem o Departamento Jurídico em ordem.

Portal - Qual era o cenário político da ocasião?

Claudete - O pior possível. Estávamos no período de implantação do PAS (Plano de Assistência a Saúde) e decidi que teríamos de adotar uma postura mais ativa, demonstrando nosso descontentamento com a situação. Fizemos uma série de atividades para alertar os servidores a não aderirem a esse malfadado e vergonhoso Plano, permeado pela corrupção. Foram grandes, vários e criativos atos, que começaram a chamar a atenção da opinião pública e também da imprensa. Pedimos a abertura de uma CPI no PAS, denunciamos o esquema do "frangogate (compra, superfaturada, de frangos, feita pela Prefeitura)", ou seja, instauramos, uma política de enfrentamento a Maluf. Em conseqüência, logo começamos a sofrer pressão por parte de seu governo.

Portal - Na altura desses acontecimentos, imagino que o Sindsep já começava a sair do ostracismo e a ganhar maior projeção, não é?

Claudete - Exato e aproveitei isso...Montamos um plano de ação para organizar a casa, aumentando o número de filiações (servidores que se associam ao Sindicato), informatizando nossos serviços, comprando carros para a entidade e já visando a compra da nova sede (a atual). Fiz uma projeção, dando prazo de um ano, para que estivéssemos numa sede própria. Muitos diretores achavam que eu era louca, que era muito arriscado fazer tal investimento, etc. Eu ouvia todos os lados e permanecia irredutível. Finalmente achei o local. A casa onde hoje está instalada nossa sede, na Vila Mariana (em São Paulo). Novamente os colegas do Sindicato achavam que eu estava equivocada, pois a casa em questão não oferecia atrativos. É verdade, mas possuía uma área útil bastante extensa nos fundos e com uma boa reforma ficaria ótima. Isso pôde ser constatado por todos, depois que as mudanças foram feitas. Construímos um salão, nos fundos (batizado, Auditório Zumbi dos Palmares), onde hoje realizamos assembléias, reuniões, festas e outros eventos, inclusive cedendo o espaço para outras entidades. Há um detalhe que faço questão de dizer quanto a inauguração da casa. A diretoria, até hoje, não quis que a placa de inauguração, feita para a ocasião, fosse colocada na frente da sede...

Portal - Ué, mas por que não?

Claudete - ...Provavelmente por causa dos dizeres da placa: ´Primeira sede própria do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais - Claudete Alves, presidente´.

Portal - Nossa!

Claudete - Ciumeira pura...

Portal - Ei, e quanto ao prazo de um mês que você havia dado aos advogados do Sindicato, para colocarem o Jurídico em ordem?

Claudete - Pois é. Eu havia dito a eles que caso o prazo espirasse e as coisas continuassem desestruturadas, eu iria substituí-los. Infelizmente tive de cumprir o prometido, pois passado um mês nada estava solucionado e as desculpas apresentadas não sustentavam a realidade. Era preciso levantar o Sindsep, transformá-lo numa entidade organizada, com uma administração eficiente. Como iríamos criticar a desordem do governo (na época, de Paulo Maluf) se nós mesmos estávamos desorganizados, se sequer conseguíamos auxiliar os servidores no encaminhamento dos processos jurídicos que envolvem, além de ações pleiteando pagamento de diferenças salariais, questões trabalhistas. Contratamos um escritório de advocacia, altamente competente e especializado, que deu e está dando conta do Departamento e demiti os outros advogados. Tudo isso atraiu a atenção dos servidores, que passaram a estar mais próximos do Sindicato, tornando-se sócios e participando das ações e eventos realizados.

Portal - Considerando o número de diretores do Sindicato (mais de 50), foi difícil estabelecer um consenso entre as idéias adversas?

Claudete - Eu centralizava muito a administração do Sindicato, caso contrário nada que empreendi teria funcionado. Quando compramos a sede fui muito criticada, pois temiam dívidas e gastos excessivos, além de não terem gostado do imóvel escolhido. Mas, bati o pé para defendê-lo, porque na minha visão, precisávamos de um lugar bem localizado e próximo a algum metrô, o que facilitaria o acesso dos servidores. Demos uma parte do valor total da casa e em um ano, pagamos o restante. Valeu o sacrifício. Sem isso não se adquire nada na vida...A alavancada do Sindsep foi ainda, auxiliada pela estruturação de nossa Escola de Informática. Fiz questão de montá-la, já visando a necessidade de formação dos servidores frente ao mercado de trabalho atual, que exige o máximo de formação. Já éramos filiados a CUT (desde a fundação do Sindicato) e a Fetam (Federação dos Trabalhadores Municipais de São Paulo), e em 1994, na Argentina, fui eleita vice-presidente da ULATMUN.

Portal - Como é o Sindsep hoje?

Claudete - Estamos com cinco subsedes, espalhadas em todas as regiões da cidade (Norte, Sul, Leste e Oeste). A Escola de Informática, agora é uma Escola de Qualificação Profissional e conta com outros cursos como inglês, espanhol, manutenção de micros e três módulos de informática.

Portal - No Sindicato, você tem de conviver com muitos homens e como está num cargo acima do deles, também tem de administrá-los. Com esse seu gênio forte, que não leva nada para casa e não abre mão das idéias, como lida com a questão do machismo?

Claudete - Tendo autoridade, mas sem ser autoritária, apesar dos homens serem a minoria dentro do Sindicato (a maioria das diretoras e funcionários, são mulheres). Muitos exploravam meu potencial de luta, me tratavam bem, mas acreditando que eu comeria na mão deles sempre que quisessem. Enganaram-se redondamente. Nunca deixei de defender posições contrárias preocupada em angariar aliados. Meus aliados respeitam minhas opiniões e a maneira como as defendo (até o fim). Senti, por parte de uma série de colegas masculinos, o peso de ser mulher e negra, mas não dei ouvidos a isso.

Portal - Que divergências você tinha, ou tem, com os diretores do Sindsep?

Claudete - Tive muitas porque era a favor de que o Sindicato assumisse uma postura mais ativa, quanto aos absurdos da Administração Municipal. Por exemplo, ao meu ver, não dava só para ficar parado na porta da Prefeitura, reclamando. Resolvi introduzir coisas novas, nas nossas manifestações. Coisas que chamassem a atenção do público, da imprensa e de quem nos interessava: o Prefeito e seus secretários. Um dia propus que fizéssemos um bolo de 100 quilos, além de uma faixa com os dizeres 'A Justiça é cega, mas sempre usou boas lentes e excelentes contatos', para satirizar o período de um ano, durante os quais ainda não havia sido julgada a inconstitucionalidade do PAS. Sob protesto de alguns diretores, fizemos uma grande manifestação em frente ao Tribunal de Justiça, na Praça da Sé, que foi divulgada em todos os veículos de comunicação. Outra idéia minha, foi distribuir 600 quilos de frango para o povo, na Praça Ramos de Azevedo, para malhar o escândalo do 'Frangogate' , envolvendo as esposas de Maluf (Silvia) e de Pitta (na ocaião, Nicéia). Fui a primeira a denunciar o assunto, ao vivo, no Bom dia São Paulo (da tevê Globo). Em outra ocasião, decidi que distribuiríamos 5 mil abacaxis, também na Praça Ramos de Azevedo, de novo em protesto a Administração Pitta. Todo ano, passamos a fazer uma atividade significativa no 1o de Abril (dia da mentira) e a participar de todas as caravanas e ações da CUT. Crescemos, nos tonamos referência para a mídia e para os servidores municipais.

Portal - Aí você já havia conquistado todos os diretores do Sindicato, mesmo aqueles que no começo eram contrários às suas iniciativas?

Claudete - Mais ou menos. Um Sindicato é como um partido, existe um interesse comum que no nosso caso, é zelar pelos direitos dos servidores, batalhando por melhores condições de salário e de vida para eles. Só que as maneiras de se empreender essa luta, divergem às vezes. Mas, como já disse, eu nunca me intimidei. Quando tinha certeza de que uma determinada coisa seria importante e daria certo, eu fazia e pronto. Quem não concordava era obrigado a engolir. Só que, diante dos resultados favoráveis que as idéias 'malucas' que eu tinha, rendiam, todos ficavam animados e reconheciam que o esforço havia sido válido. Ficamos tão em evidência e conseguimos incomodar tanto a Administração Pública, que quando Maluf passou seu cargo a Pitta, disse a ele 'você só tem de se preocupar com o Sindsep, porque tem uma louca lá'.

Portal - Foi em meio a esses constantes ataques a Pitta, que você recebeu ameaças de morte?

Claudete - 'Senhora presidente, honre sua raça e deixe o Pitta em paz. Estamos de olho em você'. Um belo dia cheguei em minha casa (na ocasião, morava na Cohab de Itaquera) e me deparei com essa faixa, colocada bem na frente do meu prédio. Não bastasse isso, pessoas haviam batido em minha porta, enquanto eu estava ausente, e feito ameaças à minha filha e minha mãe, as únicas que se encontravam em casa. Fiquei com muita raiva e temi por minha vida e a de meus familiares. Tive de mudar de endereço, morei em hotéis durante dois meses, e hoje moro num local que não pode ser divulgado.

Portal - Nem isso te fez desistir. Pegar suas coisas e ir para uma cidade do interior, e viver tranqüilamente com a família, ou algo do gênero?

Claudete - É claro que tal coisa não foi nada agradável, e denunciei o fato ás autoridades e à imprensa, mas ao mesmo tempo nos deu, a mim e a minha família, mais força e coragem para continuar. Eu tenho um compromisso, uma missão a cumprir na minha vida e não pretendo desistir no meio do caminho.

Portal - Como você avalia a eleição de Pitta para Prefeito, a atuação que teve e está tendo, o fato de ter sido cassado, enfim, o papel dele enquanto político e enquanto homem negro?

Claudete - Para mim Pitta é um bode-espiatório consciente. Foi eleito para pagar o 'pato' de Maluf, sozinho. Ele nunca assumiu sua negritude, coisa que começou a fazer somente quando ficou vulnerável, diante das acusações, denúncias e revolta do povo, contra sua pessoa. Aí usou o fato de ser negro, para defender-se, dizendo que estava sendo acusado por esse motivo e procurando safar-se das responsabilidades que tem em todo o processo de corrupção que veio a tona na Prefeitura. Até então, era um homem sem cor. Fico triste, muito triste com isso. Pois acho que, talvez seduzido pelo dinheiro fácil e pela ganância, não se ateve ao fato de que ele foi o primeiro prefeito negro que já tivemos em São Paulo e do peso que isso tem. Não que só por ser negro, ele tivesse de ser perfeito (embora, muitas vezes para conquistar o espaço e o respeito que queremos, temos mesmo de ser perfeitos ou quase perfeitos), mas ideologicamente falando, sua eleição e seu mandato eram uma grande oportunidade de mostrar a sociedade racista que nós negros temos sim, um enorme potencial. Que somos capazes, que somos inteligentes, que devemos e merecemos ser respeitados. E que não nos têm de ser dado como 'prêmio', ou 'agrado', isso é simplesmente um direito. O respeito de um cidadão pelo outro, é uma obrigação. Pitta poderia ter provado isso, Pitta poderia ter deixado isso bem claro, através de empenho, honestidade, trabalho sério. Ele poderia ter sido um exemplo. Realmente, só tenho a lamentar.

Portal - Quer dizer, na sua visão, por ser um líder político e negro, Pitta tinha uma espécie de 'compromisso' , com as pessoas de sua raça?

Claudete - Por ter sido eleito prefeito de São Paulo, ele já tinha um compromisso de seriedade e competência com a população. Por ser negro deveria ter, no mínimo, consciência de que no Brasil existe racismo e estar ciente das implicações disso. É inadmissível estarmos num país onde grande parte dos habitantes são negros e não termos nenhum ministro e apenas um governador da raça negra. Além disso, representamos 0,02% da bancada de deputados e 0,01% dos vereadores. Não basta, entretanto, ser eleito, ocupar os lugares. É preciso haver compromisso com a questão racial e com os problemas sociais dos cidadãos.

Portal - Essa questão da quantidade bastante baixa de lideranças negras na política, foi colocada por você durante um encontro de candidatos negros do PT, realizado em São Paulo neste ano, causando polêmica. Esse tipo de problema chega a acontecer dentro do próprio partido?

Claudete - O negro, seja da direita ou da esquerda, tem de defender seus direitos e seu espaço, mas não por ser negro e sim por sua capacidade. Foi isso o que eu disse nesse encontro de candidaturas negras. Não quero ser destacada, ou apresentada pelo fato de ser mulher e negra, mas pelas lutas e atuações que já empreendi em movimentos populares e no Sindsep. É claro que me orgulho de ser negra e mulher, aliás, me orgulho muito. Por outro lado, me incomoda esse rótulo: 'é mulher e negra'. Isso soa como se justificasse o fato de eu estar a frente de uma grande sindicato, ou de estar pleiteando uma vaga na Câmara Municipal de São Paulo como vereadora, para dar continuidade ao trabalho que venho fazendo há vinte anos. Tenho, por trás desse 'rótulo', toda uma trajetória que me torna apta a ocupar o lugar que ocupo e de querer mais.

Portal - Quais são os líderes negros que você mais aprecia?

Claudete - Sem dúvida, todos eles foram muito importantes. Mas destaco Malcon X, pela ousadia e arrogância (necessária) que teve e pela maneira como procurou fazer as pessoas de nossa raça voltarem-se para seus valores, sua identidade, para que descobrissem o quanto são bonitas e importantes, resgatando sua auto-estima. Luther King, pela hombridade, caráter e sabedoria com que se posicionava em prol da igualdade racial. E, é claro, eu não poderia deixar de citar, nosso Zumbi dos Palmares, afinal, toda a resistência e luta contra o racismo no Brasil começou com ele. A história de Zumbi tem de ser contada em casa, para as crianças, e na escola, valorizando a coragem que ele teve e imortalizando a essência que fica do episódio dos Palmares, que para mim significa algo assim: 'lute sempre pelos seus direitos de cidadão, de raça, de ser humano. E quando quiserem tirá-los, ou desrespeitá-los, imponha-os na marra, se possível, mas nunca se entregue ou se venda'.

Portal - Como uma mulher negra, deve se comportar diante de nossa sociedade racista e machista para obter sucesso e respeito. Você daria alguma fórmula?

Claudete - Deve exigir respeito, acima de tudo, ou seja, não abaixar a cabeça diante de qualquer pessoa que queira desmerecer sua potencialidade, ou ridicularizar suas idéias e ideais. Gosto muito de uma frase do Steve Biko (líder negro sul africano) que é mais ou menos assim, ' Num país racista, ser um negro consciente não é só uma questão de pele, é também uma questão política'. Isso vai de encontro com o que penso. O negro nesse país têm de ser ousado, inteligente e sábio. Vivemos uma realidade, que é a existência do racismo, então temos de aprender a dançar conforme a música. Como? Se temos de ser os melhores, seremos os melhores. Se temos de ser os mais eficientes, seremos os mais eficientes. Se temos de ser os primeiros, para provar nossa capacidade, seremos os primeiros. É claro, somos seres humanos, como o branco, portanto cometemos falhas, erramos, assim como todo mundo. Mas, estando submetidos a uma sociedade racista acontece o seguinte, não nos proporcionam as mesmas oportunidades que os brancos costumam ter (nos negam vagas, nos dificultam acesso ao estudo, a promoções, etc.) e quando a conquistamos com garra e na marra, exigem que nos transformemos em 'super-homens' e 'super-mulheres', os que nunca cometem erros, os que são os melhores. Tipo, 'você não quis chegar até aqui? Então não cometa sequer um deslize'. Bem, vamos comprar essa briga. Vamos ocupar os espaços. Se o Estado brasileiro não fosse racista não seria necessário adotar políticas propositivas, no sentido de garantir igualdade de direitos, mas diante da realidade que se apresenta, acho importante haver medidas contra a discriminação.

Portal - Sendo casada e mãe de dois filhos adolescentes, com essa vida corrida que tem, como consegue conciliar suas atividades sindicais e agora, de campanha, com a vida familiar? Há muitas brigas com o maridão, por causa disso?

Claudete - Olha, eles são muito compreensivos e tenho uma mãe maravilhosa que me ajuda imensamente. Ocorreu todo um processo até que o Jorge (o maridão) aceitasse minha militância. Acho que minha sensibilidade feminina conseguiu influenciá-lo, tanto que hoje ele é cúmplice de meus ideais. Mesmo tendo me sacrificado, por diversas vezes, em que tive de deixar minha família para me dedicar a militância em prol do bem estar de todos os servidores públicos municipais e da população como um todo, chegando tarde em casa e coisa e tal, jamais deixei de dar atenção e amor a ela. Lia os cadernos escolares das crianças, nas horas vagas que tinha, conversava bastante com os dois, enfim, não deixei de ser mãe e esposa.

Portal - Você é candidata a vereadora nas eleições deste ano. Quais são suas aspirações dentro da política?

Claudete - Acabei me candidatando a pedido dos próprios servidores e de colegas de militância. Se for eleita, pretendo continuar a luta em prol do funcionalismo municipal e dos interesses gerais da população. Sempre fui ousada e acho que essa ousadia foi o que também me impulsionou a querer iniciar uma trajetória política no Parlamento. Se depender de mim, não vai parar por aqui. Quero ser presidente da república, sendo talvez, a primeira negra presidente do país. Por que não?

Quem quiser fazer mais perguntas ou obter informações sobre Claudete, pode fazê-lo através do e-mail : comiteclaudete@bol.com.br
ou pelo fone (11) 3101-1913.

..."exigir respeito, acima de tudo, ou seja, não abaixar a cabeça diante de qualquer pessoa que queira desmerecer sua potencialidade, ou ridicularizar suas idéias e ideais"...
...Militante de movimentos populares (moradia, contra o racismo e outros) e do Partido dos Trabalhadores, desde os 15 anos de idade...
Dei um prazo de 30 dias para que os advogados colocassem o Departamento Jurídico em ordem
Claudete Alves, entre Vicentinho e Benedita da Silva
Fiz uma projeção, dando prazo de um ano, para que estivéssemos numa sede própria. Muitos diretores achavam que eu era louca, que era muito arriscado fazer tal investimento, etc. Eu ouvia todos os lados e permanecia irredutível. Finalmente achei o local. A casa onde hoje está instalada nossa sede, na Vila Mariana (em São Paulo).
...Senti, por parte de uma série de colegas masculinos, o peso de ser mulher e negra, mas não dei ouvidos a isso. ...