No dia em que estava trocando o piso de um apartamento em um bairro longe do seu, foi à padaria da esquina, precisava comer alguma coisa, mas notou que esquecera o RG. Sentiu medo. Pessoas como ele desaparecem na rua. No caminho, uma senhora sai de um prédio para iniciar o passeio com o cachorro. Acelerou. Era comum que segurassem a bolsa e apressassem o passo na sua presença. Conseguiu ultrapassá-la e seguir na frente dela. Pessoas como ele são suspeitas. Antes de entrar na padaria averiguou se estava minimamente apresentável. Havia trocado de roupa antes de sair. Não gostava de andar na rua com roupa de obra. Pessoas como ele são instáveis nesses estabelecimentos. Pediu os pães estendendo o indicador, com o dinheiro visível na mão. Dessa forma saberiam que poderia pagar. Na saída foi simpático com o homem do caixa. Pessoas como ele têm fama de serem marrentas ou muito engraçadas. Ele sempre se dedicava à segunda opção. Para que a vida fosse mais leve. A dos outros, claros.
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Gabriel Messias
Viveu infância e adolescência no litoral de São Paulo, mas hoje está na capital, onde é professor de escola pública, escritor e compositor. Já publicou em diversas antologias, entre elas: “Cadernos Negros” nº40, pela Quilombhoje, editora em que, em 2020, contribuiu com a leitura crítica dos poemas que fariam parte da antologia de número 43. Seu primeiro livro de poesia, “Não cabe muito” foi lançado em 2019, pela editora Selin Trovoar, e já está em sua segunda edição. Como compositor, foi agraciado com o prêmio de terceiro lugar no Festival de Música Negra do Ilê Aiye, tornando-se o primeiro paulista a ganhar esse título. O autor gosta de se autopublicar em zines e saraus. É leitor,e ama ser assim com sua companheira Renata. Entra na livraria só para olhar, mas não hesita em comprar literatura independente. Gosta de conversa sincera e poucas pessoas na mesa. Prefere cartas, escreve diários e gosta do silêncio, mas não perde um carnaval em Salvador. É devagar, de vagar por aí.
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Esse negro escritor preto, faz parte da antologia PRETOS EM CONTOS – Volume 2.
Antologia preta de contos curtos que reúne narrativas de escritoras negras e escritores pretos brasileiros com diversas matizes literárias, com vários olhares e com heterogêneas escritas.
Publicado pela Editora Aldeia de Palavras
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